“Operação: Lioness” – Entre o dever e o trauma: uma guerra que ultrapassa fronteiras

A série “Operação: Lioness” (título original: Special Ops: Lioness), criada por Taylor Sheridan, é uma produção da Paramount+ que mergulha no universo sombrio da espionagem americana contemporânea, destacando principalmente o papel das mulheres em missões de combate antiterrorismo. Com um elenco de peso liderado por Zoe Saldaña, Nicole Kidman e Laysla De Oliveira, a série é inspirada em um programa real da CIA, o chamado “Programa Lioness”, que treina mulheres para se infiltrarem em redes terroristas, principalmente através da aproximação de mulheres de alto escalão nesses círculos.
Enredo envolvente e tensão constante
Na trama, seguimos Joe (Zoe Saldaña), uma agente veterana da CIA que comanda uma operação altamente delicada. Joe recruta Cruz Manuelos (Laysla De Oliveira), uma fuzileira naval determinada e brutalmente eficiente, para se infiltrar na vida de uma figura-chave do terrorismo no Oriente Médio. Cruz precisa se aproximar da filha do alvo e, ao mesmo tempo, manter sua lealdade intacta diante de um mundo onde confiança e verdade são praticamente inexistentes.
A série mistura ação intensa, dilemas morais e o fardo psicológico de se viver uma vida dupla. Ao mesmo tempo que expõe os bastidores da guerra contra o terror, também oferece uma poderosa reflexão sobre identidade, trauma e sacrifício.

Mulheres na linha de frente
Diferente de muitas produções de espionagem, Operação: Lioness coloca as mulheres como protagonistas, não apenas como agentes de campo, mas como líderes estratégicas, tomadoras de decisão e vítimas diretas das consequências emocionais da guerra.
Joe, por exemplo, vive o conflito entre ser uma mãe e uma oficial da CIA, incapaz de se desligar emocionalmente de ambas as realidades. Cruz, por outro lado, é uma jovem em busca de pertencimento, que se vê mergulhada em um ambiente onde é forçada a mentir e manipular para sobreviver — o que a leva a vivenciar angústias intensas.
Realismo e crítica
A produção não tenta romantizar a guerra. Pelo contrário: a série expõe o preço real pago pelos agentes secretos — especialmente mulheres — que são colocadas em zonas de perigo extremo, muitas vezes sem apoio emocional ou psicológico adequado.
A fotografia crua, os diálogos densos e as cenas de combate realistas são elementos que elevam o drama e reforçam a ideia de que o maior campo de batalha, muitas vezes, é o interior.

Análise psicológica e psicanalítica de “Operação: Lioness”
Psicologicamente, Operação: Lioness é um estudo sobre identidade fragmentada, estresse pós-traumático e repressão emocional. As protagonistas vivem sob pressões tão extremas que precisam criar personas completamente distintas para sobreviver. Cruz, por exemplo, assume um papel que não condiz com sua verdade interna, e isso a leva a uma dissociação de identidade, típica de quem está em constante estado de alerta (hipervigilância).
O conceito de “falso self”, desenvolvido pelo psicanalista Donald Winnicott, pode ser claramente aplicado à personagem Cruz. Ela precisa se mostrar forte, manipuladora e sedutora, mas esse comportamento não representa seu “self” verdadeiro — apenas um mecanismo de defesa criado para sobreviver em um ambiente hostil. Essa desconexão pode levar a episódios de colapso emocional e crises de identidade, algo que é explorado nos momentos mais íntimos da personagem.

Já Joe representa o arquétipo da “mãe guerreira”, que carrega a culpa por não conseguir proteger tanto seus filhos biológicos quanto os “filhos” que lidera na operação. Essa culpa, segundo a teoria psicanalítica de Melanie Klein, pode levar a mecanismos de reparação, nos quais o sujeito tenta compensar as falhas do passado com ações exageradamente protetoras no presente — algo que vemos quando Joe tenta preservar Cruz a todo custo, mesmo colocando a missão em risco.
Além disso, o trauma acumulado pela constante exposição ao risco de morte e à violência é visível em ambas as personagens. Os sintomas clássicos de transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) estão presentes: insônia, irritabilidade, flashbacks, dificuldade de estabelecer vínculos afetivos e uma visão distorcida da realidade. Em Cruz, o trauma ainda é embrionário, mas em Joe ele já se consolidou, tornando-se parte de sua personalidade endurecida.
Conclusão
Operação: Lioness é mais do que uma série de ação e espionagem. É um retrato profundo da condição humana diante de contextos extremos. Com personagens femininas intensas e camadas emocionais complexas, a obra mostra que, em guerras silenciosas como a da espionagem, a maior batalha é contra os próprios demônios internos.
A série nos convida a refletir sobre o preço de servir a uma causa maior e os limites entre o que somos e o que fingimos ser. É, sem dúvida, uma obra que merece ser assistida com atenção — não apenas pelo enredo eletrizante, mas pelas camadas psicológicas que revelam os horrores internos de quem vive à margem da verdade.